20 de setembro de 2010

BÍBLIA - NÚMEROS (aula 09)


Este livro se chama Números porque começa com um grande recenseamento do povo hebreu no deserto.

Após a libertação da escravidão no Egito (livro do êxodo) e a formação recebida no Sinai (livro do Levítico), o povo recebe as últimas instruções e se põe em marcha pelo deserto (Números) até a planície de Moab, onde Moisés profere o seu último discurso (Deuteronômio), visando à conquista e à organização do povo na Terra Prometida.

Para os hebreus, a saída do Egito foi uma lenta e penosa caminhada em busca da terra.

Neste livro, a caminhada se transforma numa majestosa marcha organizada de todo um povo. No centro de toda caminhada está a arca da Aliança, o que destaca não um relato histórico, mas uma transmissão de mensagens.

À luz da caminhada do povo para a terra prometida, estamos nós em busca do Reino de Deus. A organização mostra que, dentro do povo de Deus, as funções devem ser repartidas, mas com um único objetivo: realizar o projeto de Deus.

A arca de Deus no centro indica que, nessa caminhada, Deus está sempre presente no meio de seu povo.

Porém, nos depararemos com fortes conflitos (capítulo 16) e que seus chefes estão sujeitos a fraquezas e desânimos, por mais importantes que sejam na comunidade.

O livro se abre ao papel do profeta, que na caminhada do povo de Deus para a Terra Prometida, deve haver sempre um lugar para o profeta (22 a 24).

O nome “Números” veio da tradução grega do AT. O título do livro em hebraico é mais interessante: “No deserto” (bamidbar).

Neste livro, o deserto é o personagem principal e decisiva.

A divisão do livro
1,1-10,10: os últimos 19 dias no Sinai;
10,11-21,35: em marcha pelo deserto;
22-36: em Moab, diante da Terra Prometida.

A primeira parte prolonga e completa a apresentação das instituições descritas no Êxodo e no Levítico.

A segunda parte é a saída de Israel do Sinai, atravessando o deserto, chegando aos limites da terra de Moab.

A terceira parte começa com um novo recenseamento (26) e contém as disposições de Moisés para a partilha dos territórios conquistados (32).

O livro Números é bastante complexo e suas tradições possuem materiais que vieram à luz num período de mais de oitocentos anos, entre 1230 e 400 a.C.

Nele encontramos textos javistas (preocupações da corte Davi e Salomão, significação universal do povo), eloístas (preocupação com as tribos, Moisés é o profeta e comunica o espírito profético) e sacerdotais (refletindo a preocupação com os sacerdotes em torno do culto). Trata-se de um relato, com elementos legislativos.

Compreendendo que o conflito de sistemas é o cerne da Bíblia e que ele foi instaurado pelo próprio Deus, cabe a todas as pessoas que se dedicam à evangelização, vencer o conformismo que aprisiona o povo no velho sistema para instaurar o conflito e instigar à luta pela construção de um novo sistema.

O Deserto
É o lugar da educação, onde o povo deve aprender um novo modo de viver. A passagem do Egito para a Terra Prometida foi longa... tempo para transformações...

Deserto é lugar de dificuldades e desgraças (11,1-3)...
Deserto é lugar de fome (11,4-9)...
Deserto é lugar de racionamento (11,4.13.31-34)...
Deserto é lugar de pragas e doenças (17, 6-15)...
Deserto é lugar de sede (20, 2-13)...
Deserto é lugar de cansaço (21, 4-9).

O quadro de conflitos mostra que as coisas não são pacíficas no processo de conquistar a vida. Damos valor ao que conquistamos. O deserto é um tempo de rever as próprias atitudes, projetar vida, projetar sonhos... dar passos.

Moisés demonstra grande paciência e é descrito como “o homem mais humilde entre todos os homens da terra” (12,3), mas tal qualidade não o pouparam do desânimo, da dúvida e até do espírito de vingança.

O resultado da caminhada no deserto é sombrio, nenhum dos que saíram do Egito entraram na Terra, nem o povo, nem Moisés e Aarão.

Quem vai entrar na Terra é a nova geração (14,31; 26, 63-65), que poderá aprender com erros e acertos da geração anterior.

É graças a Moisés que o povo liberto recebe a sua primeira organização.

O Decálogo é incompreensível sem o movimento de libertação.

Todos vêem as coisas ou os acontecimentos, mas em geral, as pessoas ficam na casca ou na aparência dos acontecimentos. O profeta penetra a casca e vai ao seu núcleo profundo, que é o segredo que o acontecimento possui.

SEGREDO
- COISA = ACONTECIMENTO
- VONTADE DE DEUS
(sentido do acontecimento)

Assim, Números nos confirma a presença de Javé como Deus libertador, Deus da vida.

Um Deus que está no meio do povo, presente na “tenda do encontro”, não se encontra em edifícios ou estruturas, mas está no meio do povo. Deus é popular: não quer estar acima e nem longe do povo.

Estamos diante de um Deus que acompanha e guia o seu povo, um Deus vigilante, compassivo, exigente.

O livro todo é pontilhado pela expressão “Javé disse a Moisés” ou “Javé disse a Moisés e Aarão” (1, 1.54; 2, 1.34).

Israel é o povo que ouve a voz de Javé mediada pelo seu profeta.

Assim é a experiência vivida no deserto, um lugar da educação ideológica de Israel: deixar os mitos do antigo sistema e começar a cultivar a memória, formando a consciência histórica capaz de produzir e solidificar um novo sistema.

O Salmo 78 nos convida a rezarmos esse momento, essa lembrança e esse esquecimento.

É no deserto que se encontra a solidariedade.

É no deserto que a solidariedade social despertará a nova comunidade, na luta e na conquista da nova terra.

Um povo que não conheça a solidariedade social é um povo fraco e vulnerável, totalmente impotente diante da liberdade e da vida.

Um comentário:

  1. Esse simples resumo foi a melhor visão que tive do complexo livro Números do AT. Gostaria muito de poder morar por perto para poder participar de aulas assim. Feliz a paróquia que possui um serviço desses, prestado ao povo de Deus. Deus os cubra de bençãos.

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