24 de outubro de 2010

PNEUMATOLOGIA - O ESPÍRITO SANTO NO ANTIGO TESTAMENTO (AULA 1)


INTRODUÇÃO
“Crer no Espírito Santo é professar que o Espírito Santo é uma das Pessoas da Santíssima Trindade, consubstancial ao Pai e ao Filho, e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado” (CEC 685)

“O Espírito Santo está em ação com o Pai e o Filho do início até a consumação do Projeto de nossa salvação. Mas é nos “últimos tempos”, inaugurados pela Encarnação redentora do Filho, que ele é revelado e dado, reconhecido e acolhido como Pessoa.” (CEC 686)

“O Antigo Testamento proclamava manifestamente o Pai, mas obscuramente o Filho. O Novo manifestou o Filho, fez entrever a divindade do Espírito. Agora o Espírito tem direito de cidadania entre nós e nos concede uma visão mais clara de si mesmo” (S Gregório Nazianzeno)

A RUAH

Assim, no Antigo Testamento, temos “pistas” sobre o Espírito Santo: expressão, aliás, que só aparece três vezes.

A palavra hebraica ruah, que aparece 378 vezes, traduzida para o grego como pneuma, que significa sopro, respiração, ar, vento, é traduzida em português como espírito.

Ruah aparece basicamente com três acepções:
- Acepção básica: vento, respiração.
- Acepção antropológica: força vital, princípio de vida, sede do conhecimento, dos sentimentos, da vontade.
- Acepção teológica: força de vida de Deus, pela qual ele age e faz agir. Força profética. Espírito de Deus.

É a utilização num determinado contexto, com uma certa intenção, que determina o valor e o sentido do termo.

O sopro-espírito recebe várias qualificações conforme os efeitos dos quais ele é o princípio: entendimento, sabedoria, etc.

A qualificação que mais nos interessa é o “sopro de Deus”, que expressa o poder que produz efeitos no mundo, no homem, naqueles que recebem o dons de líder, de profeta, de homem religioso, etc.

O que sempre uniu Israel foi a certeza de que o próprio Deus o livrou da servidão no Egito e o conduziu à terra prometida. Israel mantém a certeza de que Javé continuaria a livrá-lo de toda a aflição e o manteria vivo.

OS JUÍZES

Em situações de perigo extremo, Javé, como outrora no Egito, “ouve o clamor de seu povo” e sua ruah afasta a aflição ao se apoderar de indivíduos e capacitar o povo a resistir ao inimigo.

Inicialmente, surgem os Juízes, líderes carismáticos e guerreiros.

Assim:
Otoniel: “o sopro do Senhor esteve sobre ele” (Jz 3, 10)
Gedeão: “o sopro do Senhor revestiu Gedeão” (Jz 6, 34)
Sansão: “o sopro do Senhor penetrou nele” (Jz 14, 19)

É importante frisar que o arrebatamento nesses líderes carismáticos é fenômeno episódico, único, passageiro, tendo um objetivo específico em uma dada situação.

O PROFETISMO EXTÁTICO

A ruah também surge, nos primórdios de Israel, no contexto do “profetismo extático”.

Aqui a ruah não age apenas sobre um indivíduo, mas sobre um grupo inteiro de profetas, que entram em êxtase passageiro, nunca relacionado às palavras e ações salvadoras de Javé.

O profetismo extático é fenômeno episódico e passageiro.

O espírito vindo de Deus, normalmente, comunica um discernimento e uma sabedoria dentro da normalidade, sem fenômenos exteriores.

A MONARQUIA

Saul é o último dos Juízes e o primeiro dos Reis. A ele ainda se aplica a observação de que sua unção é passageira. Após sua unção por Samuel, “O Espírito de Deus veio sobre Saul, e ele entrou em êxtase profético no meio deles” (1 Sm 10, 10). Depois, diz-se que a ruah de Javé “se retirou dele” (1 Sm 16, 14)

Com Davi algo de diferente e definitivo começou. Quando Samuel o unge,“o espírito do Senhor desceu sobre Davi daquele dia em diante” (1 Sm 16, 13).

Agora não é apenas um arrebatamento: a concessão do Espírito associa-se à pregação e instrução operadas pelo Espírito.

Segundo 2Sm 23,1s, as últimas palavras de Davi foram: “o Espírito do Senhor falou por meu intermédio, sua palavra estava em minha língua”.

O Senhor agora não intervém só em situações de perigo, mas seu espírito torna-se dádiva permanente para o ungido, o eleito.

A coalizão de Espírito de Deus e poder político torna-se frágil, mesmo em Davi, o que propicia que a fé na monarquia de Javé passe para o Messias, como rei salvífico pelo qual se anseia: “Sobre ele repousará o espírito de Javé, espírito de sabedoria... Ele não julgará pelas aparências... A justiça será o seu cinto...” (Is 11 2.3.5)

OS PROFETAS

Nós cremos que o Espírito Santo “falou pelos profetas”.

A palavra profética é atribuída a um “sopro” de Javé sobretudo durante no tempo do exílio e no pós-exílio.

Três autores nos interessam: Isaías, que utiliza o termo 50 vezes; Ezequiel, que o utiliza 46 vezes e Joel.

OS PROFETAS - ISAÍAS

Isaías expressa que tudo o que existe de digno de vida vem do sopro de Deus. É Deus que comunica a vida.

É no meio dos perigos que Isaías anuncia: “Um ramo sairá da cepa de Jessé. Sobre ele repousará o Espírito do Senhor: espírito de sabedoria e de discernimento, Espírito de conselho e de valentia, espírito de conhecimento e de temor do Senhor” (Is 11, 1-2)

É claramente uma profecia messiânica também o primeiro Cântico do Servo: “pus sobre ele o meu Espírito” (Is 42,1)

É através de seu sopro que o Senhor encaminha o seu desígnio, que ele continua libertando o povo

O Messias tem traços de profeta, segundo o Trito-Isaías: “O Espírito do Senhor Deus está sobre mim porque o Senhor me ungiu; enviou-me a anunciar a boa nova aos pobres...” (Is 61, 1 a)

OS PROFETAS - EZEQUIEL

Ezequiel, um profeta do exílio, constata que o culto e o povo estão mortos. Mas Iahweh está mais do que nunca presente e seu Espírito reanimará as ossadas e seu sopro fará deles pessoas vivas, comunicando-se dentro de seus corações.

“Eu vos darei um coração novo e porei em vós um espírito novo; tirarei de vosso corpo o coração de pedra e vos darei um coração de carne. Infundirei em vós o meu sopro (espírito)” (Ez 36, 25-27)

“Não lhes ocultarei mais minha face, visto que terei derramado meu espírito sobre a casa de Israel” (Ez 39, 29)

“Filho do homem, estas ossadas podem reviver? Eu disse: “Senhor Deus, tu o sabes!” Ele me disse: “Pronuncia um oráculo sobre essas ossadas, dize-lhes: Ossadas ressequidas, escutai a palavra do Senhor. Assim fala o Senhor Deus a essas ossadas: Farei vir sobre vós um sopro para que vivais” Pronunciei o oráculo como havia recebido a ordem, o sopro entrou nelas e elas reviveram, ficaram de pé” (Ez 37, 3-5.10)

As provações do exílio levaram a uma visão do sopro de Deus mais interiorizada, purificando os corações, penetrando dentro, santificando o povo de Deus. É um novo começo, um novo êxodo, uma aliança renovada.

Deus será, através de seu sopro, princípio de vida santa para Israel.

OS PROFETAS - JOEL

Joel(350-400 a.C.), num anúncio de eventos escatológicos, estende o dom do Espírito de Deus a todos os povos: “Derramarei meu Espírito sobre toda carne. Mesmo sobre os servos e as servas, naqueles dias, derramarei o meu espírito” (Jl 1-2)

ESCRITOS SAPIENCIAIS

A partir do séc IV a.C surge uma literatura do judaísmo helenizado: os escritos sapienciais

Um de seus livros – Sabedoria – escrito por volta do ano 50 a.C. faz uma reflexão sobre a Sabedoria, quase identificando as duas realidades entre si. Ela é um espírito (Sb 1,6), possui um espírito (7, 22b), age sob a forma de espírito ( 7,7b).

A Sabedoria procede de Deus, e ela é como sua ação em benefício das pessoas, para as conduzir corretamente de acordo com a vontade de Deus.

Portanto, a ação da Sabedoria é parecida com a do Espírito, pois tem o caráter de uma força interior de transformação.

CONCLUSÕES

No Antigo Testamento, o Sopro-Espírito de Deus é ação de Deus. É aquilo pelo qual Deus se manifesta agindo para conceder a animação, a vida.

É aquilo pelo qual Deus conduz seu povo, suscitando para ele heróis, guerreiros poderosos, reis, líderes, profetas, sábios.

O Messias anunciado acumulará tudo isto.

O criador age através de sua ruah: “se envias teu Espírito, todos eles são criados e renovas a face da terra” (Sl 104, 29)

O homem vive da ruah de Deus: “Então Iahweh modelou o homem com a argila do solo, insuflou em suas narinas um sopro de vida e o homem se tornou um ser vivente” (Gn 2, 7)

A ruah de Deus recria o homem e estabele comunhão com Ele: “Porei meu espírito em vós e farei com que sigais minhas leis. Então habitareis na terra que dei a vossos pais. Vós sereis meu povo e eu serei vosso Deus” (Ez 36, 24-28)

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